On Miss nothing, Miss everything

Olhei pra ela e ela me encarou de volta. Olhos assustados de garota perdida, olhos profundos perdidos num rosto comum. "Rosto de criança", comento isso e ela me dá um meio sorriso irônico que pinta seu rosto com alguma coisa de mulher. Então, o sorriso desaparece, vai tão rápido quanto surgiu e a mulher some. Lá está ela, a boca ligeiramente aberta mostrando os dentes bonitinhos, tem uma expressão meio idiota, perdida em si mesma. Não é feia, realmente, não é feia. Tem algo de bonito nas sobrancelhas naturalmente arqueadas, parece que ela está sempre erguendo-as, mesmo sem fazer. E com a boca meio aberta. Parece estar esculpido nela, sempre, um ar de "Oh, é você". Têm o rosto comum de quem não fica bonita de perfil, mas tem ar de felina. Não de pantera, mas de gatinho assustado. Algo assim.

A pele é pálida, não do tipo branca demais, do tipo falta de cor, como se estivesse meio doente. O cabelo é uma bagunça, mas não caia de todo mal. Não é magra, mas não é gorda. Faço um gesto, talvez meio brusco, ela ergue a mãozinha pra proteger o corpo. Abraça-se, talvez escondendo as cicatrizes, talvez se sentindo sozinha. Pequenina, dá vontade de passar a mão na cabeça e dizer "tudo bem, tudo bem". Sorrio pra ela e ela sorri de volta, mostrando um sorriso torto e covinhas nas bochechas. Dá vontade de brincar de fazer caretas, ela é expressiva. Tem um ar triste de fim de dia, mesmo cedo. 

As mãos machucadas, os pés machucados. Sempre. Como se estivesse tropeçando e caindo e se segurando e se machucando todos os dias. Olhei de cima a baixo, e me surpreendi. Realmente, não é feia. Meio comum, meio pequena, mas não é feia. Os olhos contam histórias...

- Já é quase 7:10! - Ouço a minha mãe gritar do outro lado da porta. 

Suspiro. Olho uma última vez pra ela, dou o sorriso mais cansado do mundo e meu reflexo no espelho retribui instantaneamente. Surpreendo-me, não é tão feio, esse meu sorriso cansado.