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sexta-feira, 24 de agosto de 2012

Sometimes I write letters to my characters

Querida Alba,
Pensei em você hoje. Estava divagando sobre todas as mulheres que amei e todas que nunca compreendi. Esses dois tipos de mulheres, de maneira bastante previsível, são as mesmas. E é claro que pensei em você, a mais amada e menos compreendida. Se o meu coração fosse um reino, você seria a rainha - as metáforas e a hipérbole que nunca lhe impressionaram inundam essa carta como se fosse meu próprio sangue derramado no papel; e, agora que me ocorreu essa ideia, penso que deve ser mesmo. Esse é outro ponto delicado: eu nunca fui capaz de impressioná-la. Tenho a sensação gelada de que nada do que eu possa fazer surtirá tal efeito em você. É demasiadamente peculiar, demasiadamente mágica.
Demasiada, de fato. Desregrada, excessiva. Tão estranha e tão bela e tão poderosa. É demais! Eu deveria enjoar de você. Deveria odiar-lhe por tamanho exagero. Nunca gostei de nada que é demasiado... Não, isso é uma baita mentira. Eu não deveria mentir para você. Essa é outra coisa na lista das quais nunca consegui fazer. Vê-se pela minha paixão por hipérboles que eu mesma tenho quase tudo em demasia. Talvez você não estivesse apenas sendo dura quando disse que eu tenho uma queda imensa pelo drama. Mesmo assim, eu deveria ter enjoado de você. De exageros bastam os meus e você sabe o quanto eu odeio ver características minhas refletidas nos outros.
Eu deveria estar enjoada. Deveria odiar-lhe. Sim, isso faria sentido. Porém eu lhe amo com uma ferocidade assustadora e isso não faz sentido nenhum. Você não faz nenhum sentindo para mim, minha mestiça. Se você não se sentir confortável com o pronome possessivo, ignore-o. Sei muito bem que você nunca foi minha. Isso dói em mim. Por isso me acho no direito de doer em você um pouquinho - mas só um pouco, porque nunca seria capaz de desejar doer-lhe muito - e admitir que não sei o quanto do meu amor deriva do tanto que não sei sobre você ou da pessoa que você realmente é. Enquanto escrevia essa parte, aquela sensação gelada voltou. Agora ela me diz que eu nunca conseguiria doer em você, nem um pouquinho. Minha intuição me diz que grande parte do amor que sinto por você vem do seu sofrimento. Ah, a dor mais bela que eu já vi! Você sabe que tenho uma queda pela dor e tristeza alheias - assim como por hipérboles. 
Espero que ao ler essa carta, você expresse alguma emoção. Eu acabo de abrir o peito com palavras afiadas para que o sangue do meu próprio coração se derramasse no papel. Está tudo aí, o meu sangue negro de tinta no papel encharcado de hipérboles, metáforas e amor. Espero que você torça o nariz e sinta nojo. Espero que você sinta raiva ou até uma leve irritação. Eu aceito até sua pena - sim, estou desesperada.  
Essa carta não era sobre mim ou meu sangue ou minhas hipérboles. Ela era sobre você, mas não a compreendo. Como escreveria sobre algo que não compreendo? Acho que essa é a prova final de que realmente estou perdida com relação a você: eu não consigo escrevê-la. Alba. Sempre gostei do seu nome. Essa deve ser a única coisa na qual posso me dar certo crédito. Afinal, eu a nomeei. E todos sabem como os nomes tem poder, então isso deve contar para alguma coisa.

Com todo o amor e sangue do meu coração,
Sua nomeadora.

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