- Você me ganhou daquela vez, daquela vez... - Eu sussurro, meio sonhando, meio acordado.
- Que vez? - Ela sussurra de volta.
Devaneios coloridos de luz e risadas giram diante dos meus olhos, eu tento alcança-los com as mãos, agarrando o ar. Ela segura minha mão, os dedos se encaixando nos meus como se fôssemos feitos sob medida um para o outro. Encaro a mão dela na minha.
- Daquela vez... Você lembra? - Vislumbro um parque, crianças e ela. - Você lembra, minha pequena?
A luz plácida da manhã aquece meu coração, ou talvez seja ela. Eu tento manter o foco no parque, nas crianças, nela... Mas as lembranças cada vez mais se confundem com sonhos.
- Lembrar do que? Que vez? - Ela insiste.
Uma menina de cabelos cor de areia se aproxima de mim no parque. Eu tenho 81 anos a menos. Ela me mostra o desenho de um pássaro colorido demais para existir. Bonito. As cores, a luz, a menina.
"Você gosta de pássaros?" A menina pergunta.
Olho para minha mão procurando o desenho do pássaro, mas encontro uma mão segurando a minha. Me assusto, são mãos velhas. Por um momento, quase esqueço de vez que o tempo passou.
- Você me perguntou se eu gostava de pássaros. Foi ali, minha pequena, que você me ganhou. - Eu sorri para a mão que ainda segurava a minha. - Foi real? Você me mostrou o desenho do pássaro? Ou foram só mais sonhos?
As lembranças, elas parecem sonhos agora.
Ao meu lado, ela ri.
- Eu lhe mostrei o desenho. Você disse que não gostava de pássaros, mas que gostava do desenho. Eu lhe dei o desenho e... - Ela suspirou. - Você segurou minha mão.
- Segurei?- Perguntei, meio sonolento.
- Sim. - Ela segurou a minha mão com mais força. - E foi ali que você me ganhou.
"Et on se prend la main, comme des enfants
4 comentários:
És tão intenso e tão delicado. Tudo assim, ao mesmo tempo.
Obrigada :)
Meus olhos se encheram de lágrimas... maravilhoso!
lindo mesmo... como muita coisa que você escreve
Ah, obrigada.
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